quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Reencontro


O despertador de cada Segunda-Feira acorda também a saudade. Outrora calma e tranquila, ela acorda como quem tem compromissos, e dos sérios. Antes mesmo de colocar os sapatos ela já está pronta para me acompanhar na minha partida.

Minha solidão, incongruentemente, não está só. É acompanhada pela saudade e pela imaginação. Imaginação essa que te coloca nos momentos que vivo.

No dia da volta, minha sombra se desfaz da ausência de luz refletindo a anseio da chegada.  A única despedida é a da saudade. Que então dá lugar a sensação mais esperada: o reencontro.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

No café da manhã

No café da manhã
Sonhos passados a limpo
Idéias postas à mesa
No café da manhã
Preguiça pendurada na cadeira
Pés entrelaçados

No café da manhã
Carinhos de primeira hora
Palavras de primeira vez

No café da manhã
Saudade que vai bater
Pedaço de sol na cara

No café da manhã
Tudo começa

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Em sonho

Assim de sobressalto
sou acordado
pelo solavanco do asfalto

Acordo risonho
de ouvir tua voz
ainda que em sonho.

Conto as marcações estrada
e minha voz calada
diz que te amo.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Espera

No meio da mala
um fio de cabelo perdido,
a saudade cala 
o sorriso comedido.

No meio dos papéis
caligrafia num cartão,
palavras fiéis
cativam a afeição.

Entre a partida e a saudade
espero pela chegada
banhado pela ansiedade.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

O tempo

Quanto tempo o tempo tem?
Teria o tempo mais tempo que temos?
A cada segundo o próximo segundo passa mais rápido
E o tempo cada vez mais cansado.
Ou seria eu cada vez mais cansado de contar o tempo?

Quanto tempo o tempo tem?
Teria o tempo já perdido a conta de quanto tempo passou?
Saberia o tempo quanto tempo ainda resta ao tempo?
E o tempo cada vez mais cansado.
Ou seria eu na esperança de que o tempo passesse mais tempo comigo?

Quanto tempo o tempo tem?
Seria o tempo tão efêmero como o presente momento?
Saberia o tempo quanto tempo nos dois ainda temos?
E o tempo cada vez mais cansado
E eu querendo que o tempo transforme nosso tempo em uma eternidade.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Vinho ou poesia?


O que veio primeiro? O vinho ou a poesia? Talvez tenham sido criados ao mesmo tempo. Talvez o primeiro verso rimado tenha acontecido na primeira bebedeira, ou a falta de rima da poesia fez o primeiro poeta tomar seu primeiro trago.

Na realidade pouco importa. São complementares um ao outro nessa vida (e se não existirem em outras vidas vou querer voltar pra essa).

E são sempre mais gostosos quando consumidos a dois.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

A dança


Me tiraram pra dançar
Não tinha como negar
Tal pedido foi tão sincero
Que agora danço sozinho
Fora de ritmo
Ao som de qualquer coisa,
Do caminhar dos insetos
Ao barulho do ocaso.

Me tiraram pra dançar
Não tinha como negar
Dizem que quem canta
Seus males espanta
Eu digo que quem dança
Se perde no tempo
E não há nada mais gostoso

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Fogo


No lugar comum das metáforas
A paixão arde como fogo em brasa
Paixão pode ser lugar comum
Mas cada uma tem suas peculiaridades
O que mais gosto da nossa
É que ela é dupla, como o fogo acima



quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Quero

Do figo
Quero metade
Da vida
A verdade
De você
Matar a saudade

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Verborragia



 - terminar meus recessos para descansar
 - virar minhas páginas e reler o que ainda não foi escrito
 - sair dos meus lugares comuns, dos apostos, dos opostos e vocativos
 - virar minhas esquinas para não conter meus excessos
 - caminhar sob as nuvens para olhar o mundo de dentro
 - contemplar a chuva para deixar o coração chorar
 - desamarrar os sapatos para me sentir mais seguro
 - ouvir a música para escutar o silêncio de dentro de mim
 - ler o poema para rimar minha vida
 - beijar teu encanto para descansar minha ansiedade
 - dizer tudo e não falar nada
 - crescer para não me tornar solitário como a árvore

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Outono


O outono se anuncia nas palavras do meu amor:

"Dia lindo, com um sol quente, cheio de amor, e um vento gelado, cheio de saudade"

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Quando caminhas


Gosto quando caminhas para longe. Teu jeito de caminhar te trás para mais perto de mim. Gosto de admirar teus cotovelos desalinhados, brincando de equilibristas. Teus cabelos dando tchau a quem fica pra trás. Pisas no chão com a indiferença de um bicho fazendo nada, mas ainda assim sabes onde vais. Teu caminhar é leve e charmoso, como uma margarida brotando ao sol. Caminhar de balarina ensaiando. Teus braços felizes como uma criança no balanço da praça. Olhas para o chão logo que sais do meu lado, talvez para descobrir qual atalho tomar. Mas tenho que confessar, que gosto quando caminhas pra longe porque sei que na volta será como se estivessemos afastado por um longo tempo.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

poesias a esmo

gostaria
que uma dia
a poesia
que tanto assobia
alegria
parasse a tristeza
virasse a mesa
e pusesse beleza
nas minhas palavras

na correria
a ventania
leva a alegria
e deixa a apatia
vem a poesia
e acaricia
a pele fria 
que queimaria
se o sol do dia
não fosse tão tímido

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Cor-de-rosa e carvão



"Nosso sexo eh cor-de-rosa e carvão, como diria a Marisa Monte. O bico do meu seio (cor-de-rosa) toca o bico do seu peito (carvão) e mesmo com o seu bico se sentindo encabulado com o tamanho do meu, ele sabe que eles foram feitos pra estarem ali, se tocando, como uma mistura de cores que apesar da estranheza só poderia dar certo."

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Queria escrever, desabafar. Mas não sei o que dizer. Há muito em mim e nada faz sentido. Vou deixar um violão, uma bela voz e uma linda letra falarem algo. Não sei se é bem o que eu queria dizer agora. Mas eu gostaria de ter feito essa música em algum momento da minha vida.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Plural

Sendo um, sou plural.
Minhas várias metades
formam o meu todo,
mas ainda assim
sou incompleto.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Despedida

Venho por meio desta despedir-me, dar o adeus final.

Venho por meio desta agradecer aos sorrisos da multidão e à imensidão do mundo. Ao ocaso ao acaso e ao brilho incessante da lua cheia.

Venho por meio desta agradecer aos poetas e suas palavras. Ao som incessante da música do rádio.

Agradeço também à poeira dos livros, à fotografia descolorida e seu cheiro de passado. Ao cigarro fumado pela metade e ao vinho que manchou o sofá de sangue.

Venho por meio desta agradecer às minhas cara-metades, que tanto ajudaram a formar o meu inteiro.

Declaro que sempre amei viver, e vivi amando cada fatia de ar que meus pulmões tragaram.

Mas agora é hora de partir, afinal de contas, a vida já não é mais a mesma depois de ti e nos abismos do teu corpo vou me jogar.

Turbulência


a convivência comigo mesmo
é como um avião em rota
não tem buracos
mas trepida com a turbulência
é apertar o cinto
fechar os olhos
e aguardar o pouso

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Palavras no bolso

A palavra no bolso
ainda não lida
segredo de papel amassado

A palavra no bolso
ainda não dita
tímida de nascença

A palavra no bolso
caligrafia calada

A palavra no bolso
quando encontrada
grita aos meus olhos
e ilumina minha madrugada

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Palavras


Queria ser tão bom com as palavras quanto elas são para mim.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Amo tua natureza


Amo tua pele de areia da praia
Amo teu sorriso de nascer do sol
Amo teus seios de ladeira
Amo teu sexo de figo
Amo teus cabelos de brisa do mar
Amo tuas dobras de curvas de rios
Amo teus ombros de penhascos
Amo teu olhar de cachoeira
Amo tua natureza

terça-feira, 25 de agosto de 2009

A dobra do teu braço



A dobra do teu braço junta teus dois mundos: aquele que tuas mãos sentem e aquele que sentes dentro de ti. É a ponte do teu corpo.

A maciez da pele contrasta com a dureza do cotovelo logo atrás.

A dobra do teu braço é onde descansa tua alma quando dormes. Dela exala teu mais simples e completo cheiro.

É onde começa teu dia. É por onde teu coração sente saudades e respira aliviado nas alegrias.

Teu suor ali começa.

É na dobra do teu braço que sinto toda a plenitude do teu ser.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Mudez

Queria escrever, mas não consigo. Escrever o que sinto, como me sinto e onde me sinto. Mas as palavras não vem. Tiraram férias da minha cabeça. As idéias desconexas como voos atrasados. As frases esperando no sinal vermelho.

Interlocutoras da alma, as palavras entraram em greve. Pedem reajuste e atrasados. Decidiram não mais formar frases. Levaram com elas os pontos de exclamaçãos, os travessões e o ponto e vírgula.

As frases fugiram. Esconderam-se em algum lugar. Provavelmente numa prateleira cheia de livros. Ou então na memória de algum computador.

As idéias foram passear com a criatividade no campo de margaridas.

Como um culpado sem advogado repito: nada a declarar.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Aniversário


São 10 dos 32 anos da minha vida. Aniversário estranho, meio sem sentido. Presente nenhum, parabéns, só poucos.

Passei um terço de todo meu tempo dessa chamada vida no mesmo emprego.

E será que perdi algo?

Aeroportos, carros, estrada, caos aéreo, espera, festa estranha com gente esquisita, eu não tô legal. Onde deixa a bagagem?

Raio-x do tempo, tiro os sapatos para o detector de metais e para entrar em casa na sexta-feira. Minha casa guarda minhas coisas, pagar IPTU nunca foi meu forte.

Sou um prostituto de travesseiros, não estranho nenhum. Hoteis viraram meu refúgio. Quartos diferentes, mas sempre os mesmos, com a mesma falta de personalidade e a mesma televisão pra contar histórias.

Não me aperto mais na classe econômica. Não, não viajo de executiva, mas já me acostumei a tocar o cotovelo alheio durante o sono.

Vai e vem sem destino e caótico. Dez anos se passaram. E como olhar pra trás se o avião voa tão rápido?

Minha pele cheira a saudade, meu olhar a solidão.

A vida não está na sala de espera, já pegou o vôo rumo ao descohecido. Preciso pegar o meu, o resto da história fica pro futuro.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Grito calado

Grito calado
A angústia engolida
Grito calado
A dor da ferida

Grito calado
A saudade bebida
Grito calado
A verdade adormecida

Grito calado
Teu nome
Grito calado
Que te quero
ao meu lado

E então ouves meu olhar...

terça-feira, 28 de julho de 2009

Auto-reflexo

Assim, em meio à névoa, vou tateando os caminhos da vida. Procurando o rumo, mas não o rumo certo, afinal de contas ele não existe.

Vou sentindo o cheiro da tranquilidade, eu busco por ela.

Afagando os ventos que secam meus olhos, procuro, em meio aos diversos caminhos, aquele que me dará água na boca. Que me fará sentiro o arrepio na espinha.

Como um auto-reflexo, vou procurando o caminho que me leva a mim mesmo. Num movimento de fora para dentro, sem pressa, mas com uma certa determinação. Me conhecer, e me reconhecer quando vejo meu próprio rosto no espelho é o caminho para aceitar o que a vida impõe, aproveitar o que a vida dá, e amar plenamente quem está comigo.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Junto ao meu

Quero teus pé junto aos meu
escrevendo pegadas na areia da praia
Quero teus olhos juntos ao meus
esperando que a noita caia

Quero teu suor junto ao meu
pintando os lençois na cama
Quero teus gozo junto ao meu
nessa noite profana

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Eu gosto....


"Eu gosto quando a gente tá junto namorando e a gente não precisa falar nada porque a música diz tudo"

terça-feira, 7 de julho de 2009

O mar


Vi o mar. Ele perguntou por ti, disse que está com saudades. Eu disse pra ele que sinto o mesmo.

Perguntou se seus cabelos ainda são longos, eu disse que não, agora mais curtos eles atrapalham, mas são bonitos e gosto de segura-los enquanto nos amamos.

Perguntou se teu sorriso ainda é o mesmo, eu disse que não sabia, mas disse que ele é apaixonante. E então o mar me revelou que teu sorriso sempre foi assim, desde pequenininha.

Ele estava calmo e assim continuou. A tua falta o fez manter as esparsas ondas do mesmo do jeito, o fez manter baixa a voz do estouro da espuma na areia.

Ele reclamou das pessoas, disse que elas não têm os dedos dos pés como os teus. Que teus dedos longos e desencontrados o acariciam mais que o normal quando caminhas pela praia e molhas teus tornozelos grossos.

E então ele me falou que o guarda-sol e eu estávamos parecidos: sozinhos e pensando em ti.

domingo, 28 de junho de 2009

Vida moderna & mundo virtual



A era virtual chegou. Cada vez mais tenho menos coisas em minhas mãos. Tudo fácil, rápido e digital.

Fotografias só na tela do computador. Não envelhecem, não perdem o brilho, não cheiram ao passado. O passado agora é digital.

Cartas? Todas com a mesma caligrafia 'Arial'. Cartões de carinho? Clique no link e cheire o perfume dos bits.

Disco arranhado? Nunca mais. Diferentes do vinil, arquivos mp3 só tem um lado.

Amores internéticos. Sexo virtual. Leituras rápidas. Fofocas à velocidade da luz.

Tudo rápido, na velocidade dos bits.

E o ser humano cada vez mais parecido com bits: voláteis como nunca.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Inquieto

Inquieto, penso nos livros que ainda não li. Nas palavras que ainda não aprendi. Nas poesias que ainda não comi.

Inquieto, penso nas músicas que nunca cantei. Nos acordes que nunca toquei.

Inquieto, procuro teu nome na minha caixa de emails.

Inquieto, olho para o chão enquanto caminho pra não tropeçar nas formigas.

Inquieto, vasculho o céu a procura de nuvens. Pássaros que voam.

Inquieto, sinto sede da tua boca.

Inquieto, troco os canais da TV sem prestar atenção a nada.

Inquieto, estalo os dedos como se isso fosse aliviar a saudade.

Inquieto, olho tua fotografia e então, finalmente, me acalmo.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Vozes e acordes


Baixo o tom do meu acorde pra que ele não abafe meu pensamento. Microfonia existencial?

Escuto a voz que de dentro de mim não sai. Um grito surdo de desabafo.

Meus pensamentos têm voz própria, conversam entre eles como se estivessem numa mesa de bar. Fico apenas a observar, sentado, do balcão. Devo escuta-los? Leva-los a sério?

A incessante rádio mental sintonizada como se eu estivesse numa ante-sala de consultório médico. Sem chances de trocar de estação, sem chances de baixar o volume.

Ainda sou um dicso de vinil, preciso me virar pra me escutar por completo.

Agora entendo porque Caetano canta: "Quero que tudo saia, como um som de Tim Maia"

domingo, 14 de junho de 2009

Incongruência

Desconexo das coisas da vida, penso em ti com a naturalidade de um pássaro que se alimenta. Tomas meu pensamento pelos cantos, aos poucos, como se fosse a dona dele.

E a distância me força a recordar a textura da tua pele e a sentir saudades do futuro.

Teus olhos escondidos atrás dos teus óculos me questionam. Meus olhos escondidos atrás dos meus óculos respondem aos teus: a paixão por ti é inerente ao meu ser.

Tragas teu cigarro com a calma e o furor da tua paixão. Como se a cada tragada um sopro de vida entrasse nos teus pulmões. Incongruente, te sentes viva ao fumar.

Incongruente, tua inquietação se transforma em calma quando deitas. Teu gemido quieto se transforma em gozo trêmulo.

Incongruente, minha paixão por ti grita dentro de mim, um grito calmo e ansioso. Um grito de saudades e alívio. Um grito de pele ardente e paz.

Que posso eu querer de ti além dos teus pés junto aos meus?

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Contemplação



Tarde de Sábado, meu olfato se entorpece com o cheiro das nuvens que cobrem o céu como um lençol desarrumado.

Serei eu tão desconexo como meu reflexo na água?

Nada de vento, a atmosfera relaxa seu cansaço no ar denso e úmido.

Uma cadeira pra sentar as angústias, um violão para cantar as alegrias. Um cigarro para tragar os olhos pra dentro de mim mesmo.

Meus pés descalços conversam com as formigas. Minha alma se humedece com meus pés na grama.

Sorvo do ar que me cerca. Escuto cada respiração e aprendo mais sobre mim.

Os pensamentos me fogem por entre os dedos. A poesia deixa o mundo como uma foto preto e branco: parece inacabada e intensa.

As árvores me olham, discretas e curiosas, e me perguntam: o que ELA tanto contempla?

terça-feira, 12 de maio de 2009

Paixões de cada dia no canteiro da (falta de) lucidez

Viver ao sabor das paixões
Dissimular as ilusões
Desabitar as pretensões

Caminhar a cada dia
Esquecer a nostalgia
Bater na porta da alegria

Colher as flores do canteiro
Sonhar com seu cheiro
Se dividir por inteiro

Desistir da sensatez
Empurrar tudo de vez
Gozar na nossa falta de lucidez

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Arremedos...

"Se eu não quiser ser para sempre um arremedo de gente, gastando meus arremedos de dias numa vida arremedada, eu tenho que ir embora porque é somente lá no mundo que tudo acontece de verdade"

Karina, personagem de Mariana Ximenes no filme 'A Máquina'.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Saudade

A saudade é branca
Alva como nuvens sem chuva no céu
A saudade brinca como criança
Desnuda inocententemente a esperança
A saudade escancara o amor
Alivia o pudor
A saudade não abre a porta da sala
Não faz a sua própria mala
A saudade anda a cavalo
Acorda ao cantar do galo

A saudade se esconde debaixo da asa do pássaro
Só assim assim ela não consume corpo e alma

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Primavera



"Aprendi com a primavera a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira."
Cecília Meireles

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Mergulho


Uma amiga me disse: “tô como se fosse em cima do telhado olhando a minha vida”

Ana Carolina canta: “já sei olhar o rio por onde a vida passa”

Sair de si mesmo e olhar pra vida como se ela fosse uma novela. Como se fosse a vida do vizinho. Fofocar com seus amigos sobre si mesmo como se não fosse você. Aprender os próprios gostos, defeitos, efeitos e virtudes como se fossem de outrem. Tirar sarro de si mesmo. Gargalhar ao vento as próprias bobagens ditas e não ditas.

Mas sem esquecer de mergulhar de volta na vida. Se molhar na chuva para sentir o calor saindo do corpo. Rolar na neve para ganhar um abraço quente do amor.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Sorriso

Sorriso tímido ao encarar
Sorriso encantador ao contemplar
Sorriso largo, com todos os dentes a mostra
Sorriso nas roupas, no chapéu
Sorriso ao sorrir

Sorriso escancarado ao falar
Sorriso lascivo ao gozar
Sorriso bebendo água
Sorriso pedindo cerveja
Sorriso ao sorrir



Sorriso sincero ao partir
Sorriso de sono ao dormir
Sorriso efêmero mas constante
Sorriso ao sorrir

Sorriso bêbado escancarado
Sorriso fugaz fotografado
Sorriso dos cabelos ao vento
Sorriso de vida

terça-feira, 24 de março de 2009

Ausência


Pelos últimos anos da minha vida tenho-me feito ausente. Viagens e viagens. E eu ausente.

E minha ausência na vida dos outros acabou virando ausência na minha própria vida. Ausento-me de mim mesmo. Perco-me de mim mesmo em meio a travesseiros inodoros de hotéis insossos.

E alguns me perguntam: isso é vida? Como você consegue?

E eu me pergunto: fujo do que?

Talvez essa seja a maneira oficial de eu fugir de mim mesmo. Levar meus pensamentos e devaneios pra longe de todos. Não me ver refletido no olhar daqueles que me amam.

Talvez minhas ausências sejam muito longas. Talvez minha própria ausência já tomou meu lugar, usa meus chinelos e esquenta meu travesseiro, comanda a TV com o controle remoto.

Mas a ausência tem um lado bom: a chegada.

Quanto mais curta a viagem, mas deliciosa é a chegada: a ausência ainda não tomou o teu lugar no sofá. A ausência ainda não virou costume na vida dos outros.

E em cada volta pra casa, há algo que me enternece: a alegria da chegada daqueles que são recebidos por alguém. Eu os invejo, uma inveja boa, mas uma inveja. As flores perfumando, os cartazes gritando em letras vermelhas borradas, os balões sorrindo e as pessoas se emocionando.

Nas minhas viagens o pior momento nunca foi a partida, nem a ausência, sempre foi a chegada: costumava perguntar ao taxista como havia sido o tempo durante a semana para distrair minha tristeza pela flores que não me receberam.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Essa minha urgência me atrapalha

Essa minha urgência me atrapalha. Não, a frase não é minha, mas eu obtive permissão formal para usa-la.

Nossa urgência nos faz parece como um táxi levando uma grávida prestes a parir: sempre com pressa.

Vivemos na urgência. Tempos de comunicação fácil, internet, imediatismo. Tempo de aviões e ansiedades. Tudo precisa ser rápido para ser eficiente, se não é perda de tempo. Como se o orgasmo lento e profundo não fosse o melhor de todos.

Urgência em ser feliz, em ser bem sucedido, em ter o corpo em forma.

É tanta urgência que já cansei só de pensar.

E enquanto nossa urgência nos faz ter pressa, sede em demasiado como se vivêssemos num deserto, a vida passa aos nossos pés, bem devagar. E a cada esquina que a vida vira, mais urgência.

A urgência mostra sua pressa como faróis de carro atravessando uma ponte.


É tanta urgência que reclamamos que a vida passa rápido demais. Incutimos na vida as nossas urgências, e ainda temos a petulância de culpa-la por isso. Alguém poderia fazer o favor de colocar mais 24 horas em cada dia? Assim eu poderia riscar todos os itens urgentes da minha lista de coisas a fazer!

É tanta urgência que já cansei só de tentar. Será que alguém poderia fazer o favor de tomar as decisões por mim?

quarta-feira, 18 de março de 2009

Metrô

O metrô é democrático: pretos, brancos, pardos e amarelos. Crianças, adultos, novos, idosos e aqueles sem idade aparente.

É a democracia sem voz. Exceto por aquelas duas, ninguém fala. Uns dormem, outros cochilam, alguns as duas coisas.

E o que torna aquele senhor de cabelos brancos tão familiar? A mesma estação destino ou o olhar melancólico que não vê nada?

A moça morena de óculos grandes lê desinteressada o seu jornal.

O senhor de chapéu descansa o corpo ficando de pé.

Qual a sua leitura? Jornal, revista, quadrinhos ou o tempo que corre lá fora? Política ou zodíaco? Esporte ou obituário?

Pelas janelas as árvores passam sem abanar.

E aquela loira de farda militar? Sem batom ou pintura no rosto. Todo o charme no cabelo e no jeito de mascar o chiclete. Talvez o coturno esconda um pé delicado.

Os fones de ouvido criam diferentes mundos nesse pequeno vagão. iPods me mordam. Será que algum deles tem carnaval?

O metrô chora as lágrimas da chuva. Troca o dia pela noite entrando e saindo do subterrâneo. Rompe o branco dos flocos de neve sem piedade da beleza que eles trazem. Desafia o vento gelado com seu corpo metálico.

Troca de estação, mas a música é sempre a mesma: o tirintar dos rodas metálicas. Gospe e engole passageiros.

E aquelas que vêem poesia pelos trilhos devem pensar: uma pena a viagem ser tão curta...